quinta-feira, 18 de novembro de 2010

O amor que mata

Matéria feita para Laboratório de Jornalismo Impresso. Deu saudade das aulas:

O amor que mata

Quando o sentimento puro transforma-se em ódio e os apaixonados querem “eliminar” o amor

“Se não é meu, não vai ser de mais ninguém”. Esta é a frase utilizada pela maioria das pessoas que cometem crimes em nome do amor. Isabella Nardoni, Eloá Pimentel, meninas jogadas da ponte pelo pai, filhos queimados, espancamento de mulheres. Pequenas provas de que o amor mata sim. É quando pessoas perdem a vida por causa de um “caso” que tinha tudo para ficar no passado.

“Você está aqui a disposição dos seus senhores. Durante o dia desempenhará uma tarefa qualquer, que lhe seja designada, referente a arrumação da casa, como espanar, arrumar livros, distribuir flores nas jarras, servir a mesa. Não são tarefas difíceis. Mas abandonará tudo o que estiver a fazer para atender a chamada daquele que a desejar, porque o seu único serviço é o de se lhe entregar. As suas mãos não lhe pertencem, nem os seus seios, nem particularmente nenhum dos orifícios do seu corpo, que podemos apalpar e nos quais poderemos penetrar vontade...” O trecho tirado de um texto do blog Pensamento submisso (www.pensamentosubmisso.wordpress.com) exemplifica a realidade dessas mulheres, que se sujeitam a tudo (ou quase tudo) para satisfazer os companheiros e como retribuição correm o risco de perderem a própria vida.

Existem seis tipos de paixão: amor, desejo, ódio, alegria, tristeza e angustia. Com este sentimento, as pessoas se descontrolam, devido à vontade de estarem juntas. A paixão não deixa os mais românticos agirem, por ser algo incontrolável. Quando o amor é levado até as últimas conseqüências, eles não conseguem agir com a razão. A reciprocidade acalma os apaixonados. Paixão significa estar envolvido corporalmente e ela pode ser enlouquecedora, dependendo da intensidade. Qualquer paixão mata.

A educadora M.B.C., de 47 anos, é casada há 29 e tem dois filhos. Sobre o casamento ela é bem direta: “é apenas uma fachada”. Ela já apanhou do marido logo quando casou, saiu de casa, mas retornou quando a sogra foi buscá-la. Depois disso, já ouviu várias pessoas dizendo que ele tem amantes, mas nunca teve coragem de se separar por causa dos filhos. “Eu sei que eles vão sofrer e eu prefiro que eles sejam felizes e não eu”, admite enquanto as lágrimas pingam. Ela diz que assume duas personalidades: a da mulher que está com o companheiro e da mulher que está sozinha. Com ele, sente-se aflita, tem medo, não conversa, fica triste. Coragem? É o que ela mais gostaria de ter. O bom do casamento? “Só os filhos que ele me deu. E mais nada”.

A psicanalista Cláudia Murta explica que quando a pessoa chega ao ato de matar, é porque o amor já se transformou em ódio e atingiu o descontrole. “A mulher tem mais capacidade de amar do que os homens, devido aos filhos. Ela exercita mais o amor”, afirma referindo-se ao alto número de crimes passionais em que os homens são os autores. Para ela, pessoas do sexo masculino têm mais condições de odiar e demonstrar este sentimento.

A respeito do pai que jogou as duas filhas de cima de uma ponte, em Nova Almeida, por não aceitar o final do casamento, ela explica que, neste caso, a paixão estava em jogo e ele agiu de maneira irracional. Há uma grande diferença entre casal e família e muitos ficam com dificuldades de aceitar o surgimento de um filho. E aqueles que vieram para unir um laço de sangue entre os dois viram motivo de separação. O filho vira uma moeda de troca entre o casal e é quem sofre mais as consequências. Tanto o amor como o ódio são paixões.
De acordo com a psicóloga, o ciúme exagerado provém da enorme necessidade que as pessoas têm de serem amadas. “Isso demonstra um narcisismo muito grande, uma vez que querem ser o centro das atenções e quando vêem que as pessoas tem interesses fora do relacionamento ficam irritadas e agem sem limites”, explica. Porém, o ciúme varia com a intensidade da paixão.

No relacionamento, o exagero já é um sinal preocupante. O ciúme não tem relação com o amor e depende da relação do casal. Ele é a junção do amor e do ódio e acontece quando algo está descontrolado. O alerta é que quando o ciúme aparece na relação é sinal de que há algum problema.

A farmacêutica Bianca Mantovanni já entrou em muitas “ciladas” por causa de paranóias. Quando era adolescente, tinha ciúme dos amigos, familiares e até das professoras do namorado. "Uma vez eu mandei meu amigo ligar para a coordenação e falar que a professora usava blusas muito decotas só porque ouvi ele falando para o primo que tinha uma professora gata", conta aos risos. Hoje, noiva há três anos, ela diz que ainda espera o pedido de casamento e garante que o segredo do relacionamento é a pessoa se amar antes de tudo. Porém, nunca mais olhou para a ex-professora.

Sobre o caso da menina Eloá Pimentel, de 15 anos, mantida por mais de 100 horas em cárcere privado pelo ex-namorado Lindemberg Fernandes Alves, que também não aceitava o fim do relacionamento, Murta explica que trata-se de uma paixão exacerbada, pois ele estava dominado pelo sentimento, sem raciocinar.

Já sobre a menina Isabella Nardoni, que comoveu todo o país, em 2008, quando foi jogada do sexto andar do prédio onde morava, por causa do ciúme que madrasta tinha da relação que existia entre Isabella, o pai e a mãe da menina, ela diz que o ato que define o crime, e os condenados (pai e madrasta) são tão criminosos quanto quem mata por outros motivos. Na verdade, o que importa é o resultado final, ou seja, o assassinato.

A condição feminina já faz com que a mulher tenha tendência a aceitar as agressões. Trata-se de um masoquismo feminino, segundo a psicóloga. Masoquismo é uma tendência pela qual uma pessoa busca prazer ao sentir dor ou imaginar que a sente e receber o sofrimento físico e moral de outra pessoa.

Os crimes passionais vêm das questões culturais. Muitas pessoas falam por aí que querem que os ex-companheiros morram, mas o que difere é quando passam da vontade para o ato. As pessoas apaixonadas ao extremo perdem o limite, por isso que a intensidade deve ser dosada, para que os envolvidos não sejam dominados. “O excesso de paixão é insuportável”, conclui.

Segundo uma pesquisa do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), de 102.503 separações judiciais em 2005, cerca de 17 000 foram pedidas por mulheres e somente 6.000 pelos homens. Isso se deve pelas condições sociais favoráveis: algumas trabalham e conseguem se manter financeiramente sem o marido e elas perdem menos do que os homens, porque, na maioria das vezes, na divisão dos bens, ficam com a casa e os filhos, recebem pensão e podem ser tratadas como vítimas. Vale destacar que quando elas colocam um ponto final no relacionamento é porque ou o amor acabou ou foram traídas.

O jornalista Josué de Oliveira diz que seria capaz de tudo por amor, desde que não desonrasse o seu nome e não prejudicasse ninguém. Para ele, amar exageradamente é uma questão de carência. “São pessoas que procuram depositar todo seu sentimento em alguém ou em alguma coisa. São inseguras e, muitas vezes, não confiam no seu potencial”, declara.

A estudante Fernanda Menezes, de 21 anos, diz que não é sensata, mas muito experiente. Quando leva um pé na bunda, ela diz que primeiro sente raiva, depois chora, para posteriormente ir curtir a vida. Para impressionar o namorado, aprendeu a andar de moto, coisa de tinha muito medo, e o companheiro gostou. Matar por amor? Para ela, que é muito orgulhosa, trata-se de uma doença, pois quem ama não tira a vida do outro.


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