sexta-feira, 2 de julho de 2010

Um dia de Especialista

Uma tarde fria, meio chuvosa, voltada para um trabalho acadêmico. Três alunas se dedicam para fazer uma revista sobre o projeto Especialistas do Riso. Com câmeras fotográficas, uma pauta, caneta e curiosidade suficiente para entender tudo, elas se encontram e vão para a sede, onde o grupo iria para se caracterizar.

Logo na chegada, a alegria estava na face de quem as recebia. O cenário se resume nas cores. Uma parte com roupas variadas, pinturas, maquiagem, chapéus animados, óculos engraçados, e voluntários ansiosos para fazerem a ação do dia.

Sem autorização para entrar na clínica médica, as repórteres ficariam na parte externa do hospital, tentando fazer entrevistas e fotos. Foi sugerido que uma delas entrasse como acompanhante dos Especialistas, porém, sem caneta, papel, gravador e, muito menos, máquina fotográfica. A proposta era ver como tudo acontece para poder assim, humanizar mais a revista e relatar a experiência.

Caracterizei-me como tal e me senti como a jornalista que vai a campo, disfarçada, tentando trazer uma boa história. Um óculos grande, um chapéu de peixe e um jaleco foram as ferramentas utilizadas para minha visita.  Três “palhaços” e uma pessoa que tinha tudo para envolver-se com a história e não conseguir escrever nada depois.

As orientações pareciam ser simples: “não encosta nas paredes nem nas camas, não fica olhando muito para as crianças, não pergunta por que estão lá, lava a mão ao entrar em todas as enfermarias, e não chore. Se você se emocionar, saia, chore e depois volte”.

Os Especialistas tiraram sorrisos dos seguranças, médicos, crianças, familiares, e pessoas que andavam na rua. A primeira coisa que fizeram ao entrar no local foi ir até o setor de Serviço Social para saberem se havia alguma restrição ou se poderiam visitar todas as enfermarias. Desta vez, a Oncologia (enfermaria das crianças com câncer) estava com bactérias e não pode receber o grupo.

Quem visita a parte onde ficam as crianças queimadas não entra na Oncologia, por exemplo. Isso para evitar que os humoristas sejam agentes de infecção. E eles são muito cautelosos, em tudo. Optei por não ver crianças com ferimentos e preferi acompanhar a Doutora Tan Tan onde ficam crianças com problemas respiratórios. Mães tristes, cansadas e abatidas abriram sorrisos só ao ouvir a voz dos Especialistas. Uma menina que se abriu, conversou, cantou, brincou, trouxe satisfação ao grupo. De outro lado, bebês chorando, presos em caixas de oxigênio, alguns que caberiam nas palmas das minhas duas mãos. O coração apertou pela primeira vez. 

Nos setores onde ficam internadas crianças que passaram ou vão passar por cirurgias e no de Ortopedia encontrei crianças alegres, que emocionavam só pelo sorriso, mas também me deparei com quem estava sofrendo, que não queria brincadeira. Os Especialistas sabem dosar as brincadeiras: quando vêem que precisam brincar, cantar, falar mais, o fazem sem medir esforços; mas também sabem quando é o momento de não brincar, de respeitar o silêncio e a tristeza de quem tanto quer voltar para casa.

Meu coração ficou na mão, literalmente, quando entrei em uma enfermaria só com bebês. Fiquei chocada ao ver crianças tão pequenas já passando por tanto sofrimento, precisando de aparelhos para tudo. Eram todos os tipos de problemas juntos, complicações que abalam os próprios doutores do riso. Aí eu saí da sala, respirei bem fundo e voltei. É impressionante como aquelas mães amam, incondicionalmente, aqueles “pequenos”, mesmo sabendo que podem nunca levá-los para casa. Elas têm aparência triste, cansada e sofrida, por estarem cansadas e verem as crianças doentes, não poderem levar embora, mas em momento algum abandonam os bebês. O carinho delas foi algo que fez com que eu saísse de lá repensando em todas as minhas atitudes enquanto filha. Ao ver os Especialistas, essas mães animaram-se como as crianças, pois precisavam de um momento de distração.

Na Enfermaria Cirúrgica, uma mãe chamou minha atenção de forma especial. O olho brilhou ao ver os humoristas, e ela ficou triste porque a filha estava dormindo e não participaria das brincadeiras. Esta brincou e cantou como se fosse uma criança. A aparência dela mudou e deu lugar a uma mulher, forte, que sorria e conversava bastante. Na hora da janta, essa mãe voltou à realidade e assumiu, novamente, o semblante triste ao ver que a filha não queria comer. Os Especialistas conseguiram tirá-la da dura realidade e viver na fantasia por alguns instantes.

Saí de lá sentindo a cabeça pequena, triste. Na sede do projeto perguntaram-me como eu avaliava a experiência. Embora tenha aprendido muito, não foi confortável. Ver crianças tão frágeis já sofrendo tanto e mães tão dedicadas é algo que emociona.

E os Especialistas, naquele momento, só se preocupam com as crianças, em alegrá-las. Não pensam no calor, no frio, na angústia, hora ou outras obrigações. Em resumo: embora o meu final de semana tenha ficado meio triste por ter me envolvido com aquelas crianças, foi uma experiência única e indescritível.

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